quinta-feira, 29 de novembro de 2012

APARÊNCIA E ESSÊNCIA



Minha conversão ao Evangelho ocorreu no tempo em que paletó e gravata para os homens, saia e cabelo para as mulheres ainda eram sinônimos de santidade na maior parte das igrejas evangélicas – principalmente as de cunho pentecostal. Quanto mais alinhadas e modestas as vestes ou os penteados, maior a aura de santo ou de santa.

Lembro-me, por exemplo, que na pequena congregação da qual era membro se realizava uma vez por semana o chamado “culto de doutrina”, reunião em que o pastor gastava 90% do tempo de sua preleção falando sobre roupas, penteados, comportamentos, adornos, maquiagens, televisão, etc., e, pasmem, quase tudo com “base bíblica” (naquelas tipo “texto fora do contexto...”)!

Pois é, os tempos mudaram e muita coisa mudou de lá para cá. Com pequenas variantes e raríssimas exceções, nem mesmo as igrejas (ou denominações) mais rígidas resistiram a prova do tempo na observância daquilo que convencionamos chamar de “usos e costumes”. Os irredutíveis “pastores-delegados” sucumbiram ao ditames do novo milênio, e tiveram que abrir mão das exigências dos membros se vestirem assim ou assado – de vez em quando fico pensando em como é que os tais “pastores-delegados” que ficaram para assistir a transição das eras conseguem explicar, se é conseguem, que aquilo que antes era proibido hoje não é mais.

Passou a era da santidade de fachada e chegamos aos “tempos de unção”, afinal, quanto mais ungido o indivíduo, mais na crista da onda do momento! Todo mundo quer mais é receber a “unção da vitória financeira”,a “unção da ousadia”, a “unção da multiplicação”, a “unção das portas abertas” ... Ufa! Haja apelido para tanta unção!

Acontece que, assim como no passado havia uma vitrine que exibia a pseudo santidade, os “ungidões” de hoje precisam ostentar, eles têm que parecer melhores, mais abastados, mais “cheios da grana” e por aí vai – é muita frescura pro meu gosto!

Naquele tempo a santidade estava nas roupas bem comportadas, no cumprimento do cabelo (no caso das mulheres), ou na rigidez do estilo de vida. Hoje é bem diferente, a “unção” pode até estar nas roupas, desde que sejam de grifes caras! Mas também, a “unção” pode estar nos carros luxuosos; nos roteiros turísticos “five stars”; enfim, na extravagância, na opulência! A equação é bem simples: quanto mais aparência de rico, quando mais purpurina, mais ungido é o irmão!

(Se fosse falar dos pregadores e artistas gospel afetados pela “paranoia da unção da estrelinha” teria que começar um texto exclusivo só pra eles, e a coisa iria ficar mais feia – vou deixar para outra oportunidade.)

A propósito, nem tudo está perdido. Creio piamente que ainda há os milhares que não se dobraram ao Baal das aparências. Sim, são aqueles que entendem que Evangelho de verdade não é casca, é conteúdo!
Há aqueles que experimentam dia a dia a profundidade da graça e do amor de Deus, logo, não precisam se “drogar” com a superficialidade da religião de consumo, nem com a fé “coisificada”. Há aqueles que sabem diferenciar muito bem a aparência da essência: aquela se conforma com as insignificantes gratificações desta vida, esta ambiciona o que eterno!

“Isto, porém, vos digo, irmãos, que o tempo se abrevia; o que resta é que também os que têm mulheres sejam como se não as tivessem; e os que choram, como se não chorassem; e os que folgam, como se não folgassem; e os que compram, como se não possuíssem; e os que usam deste mundo, como se dele não abusassem, porque a aparência deste mundo passa.”  -  I Co 7.29-31

Um abraço!

- pr Aécio -

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

DEUS, TENHA MISERICÓRDIA DE NÓS, PASTORES!


Tenho pensado muito nas questões que envolvem ministério cristão nos últimos dias. Não tenho nem mesmo me poupado de questionamentos que passam pela certeza do chamado;   pelo preparo adequado e pelo real comprometimento com tudo aquilo que implica, que incide ou que é necessário para o bom desempenho e eficácia da práxis ministerial.

Outro dia li uma matéria no site da “Cristianismo Hoje” que citava, dentre outras coisas, estatísticas levantadas numa pesquisa mostrando o aumento de obreiros que abandonam as funções pastorais e afins, assumindo a vida secular e dedicando-se a ocupações de cidadãos comuns. Os motivos citados são dos mais diversos: Doenças, conflitos familiares, estresse, pecados e outros.

Na verdade não tive nenhuma reação ao ler aquilo e, para ser honesto, o fato de não ter me chocado com o que estava diante dos meus olhos me preocupou mais do que os números elevados de ex-pastores ou ex-obreiros que “abandonaram o cajado”.

Fiquei mais preocupado (pra ser honesto) por não ter tido nenhuma reação do tipo: “Uau! Que absurdo! Que horror!”... Pelo contrário! Tudo que estava ali me parecia muito previsível; tudo muito comum e até certo ponto aceitável ou justificável. Então, confuso pela ausência de empatia momentânea, tirei um tempo para refletir minhas próprias convicções, minha própria visão de chamado (e só do meu chamado) e assim por diante. Parei para verificar minha própria resistência à luz de I aos Coríntios 10.32, que diz “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não caia.”.

Conclui mais uma vez que não posso me ufanar por não estar naquela estatística, que devo vigiar ao máximo para não me deixar dominar pela maldita síndrome do triunfalismo, tão comum em nossos dias – aquela sensação burra que faz com que muitos “engravatados de púlpito” se sintam imbatíveis, fingindo grande parte do tempo que estão mais para “homens de aço” do que para homens de carne e osso.

A propósito, é assim mesmo que muitos obreiros vão levando suas vidas, seus relacionamentos familiares e demais interações sociais: no limite. Vi (e vejo) muitos destes cambaleantes, outros se arrastando moribundos... E assim permanecerão, até que se vejam num inferno existencial, num caos interior, ou até que assistam em tempo real o filme de suas vidas terminar em desgraça absoluta.

Que Deus, tenha misericórdia de nós, pastores!

- pr Aécio -